A Honda nr 750 é singular, e fascinante.
Honda NR750 e seu incrível motor com pistões ovais é tudo isso e mais um pouco. Lançada em 1991 em edição limitada a 300 exemplares, a história por trás do desenvolvimento desta incrível motocicleta merece ser contada.
A NR750 é hoje uma das motocicletas mais cobiçadas por colecionadores de todo o planeta não apenas pela raridade ou por ser uma máquina surpreendente em praticamente todos os aspectos. Ela, de fato, representa o ponto final de um longo e intrincado processo de desenvolvimento iniciado na metade dos anos 70, cujo objetivo foi trazer de volta a Honda à disputa do Mundial de Motovelocidade, hoje conhecido como MotoGP.
Durante a maior parte dos anos 60 a Honda dominou a cena da motovelocidade quando, em 1967, surpreendeu o mundo anunciando que iria se retirar das competições. A razão? Não havia mais nada a ganhar, mais nada a provar. Durante mais de uma década os adversários estiveram livres do opressivo poderio tecnológico da Honda.
Tais “férias” esportivas tiveram fim em 1979 quando, para a felicidade dos aficionados, a Honda decidiu voltar ao Mundial. Para isso escolheu uma receita técnica radical: em vez de fabricar uma motocicleta de 500cc com motor 2 tempos, tecnologia dominante à época, optou pelo motor 4 tempos como os de suas vencedoras do passado.
A decisão implicaria em grande desafio: sem entrar em maiores detalhes, basta dizer que o regulamento técnico da época não previa nenhuma compensação para equilibrar o rendimento entre motores, uma injustiça tendo em vista que os de ciclo 2 tempos, em paridade de cilindrada, eram cerca de 50% mais potentes que os motores de 4 tempos.
Deste modo, com o regulamento do Mundial de Motovelocidade estabelecendo como limite para a categoría máxima 500cm3 seja para motores 2T como 4T, a escolha da Honda foi temerária: como seria possível alcançar a potência de cerca de 120 cv (!!!) das melhores máquinas 2T de então com cilindrada igual?
Um jeito de resolver a parada seria aplicar uma turbina mas o regulamento não permitia a sobrealimentação. Outra solução? Aumentar o número de cilindros, receita aplicada aos modelos da marca do passado, que venceram na categoria 125 com máquinas de cinco cilindros (RC148 e 149) e na categoria 250 com as lendárias seis cilindros em linha (RC164, 165 e 166). Porém, o regulamento limita o número de cilindros a quatro, e aí está a explicação dos pistões ovais: respeitando o limite regulamentar – 4 cilindros e 500 cm3 – a maior área dos pistões ovais permitiria fazer o motor ter características de potência de um motor de 8 cilindros.
Imagine o assombro dos presentes quando a equipe Honda desembarcou no box para a disputa do 1° GP com suas NR 500 de pistões ovais! Talvez nem mesmo se verdadeiros extraterrestres tivessem se apresentado no paddock haveria tanta curiosidade. Rios de tinta foram gastos para explicar a tremenda complexidade de tais motocicletas face as simples e até mesmo rudimentares motos empurradas pelos motores 500cc 2T.
No entanto, a previsão da Honda de através da rotação elevadíssima – 15 mil rpm era o limite das pioneiras NR – igualar a potência das máquinas 2T não se concretizou: o V4 de pistões ovais enfrentou quebras sucessivas e, além disso, era pesado demais. Isso obrigou os técnicos a trabalhar duro durante três temporadas, adquirindo um vasto conhecimento técnico em áreas diversas como metalurgia, lubrificação, refrigeração e eletrônica. Tudo para economizar peso, ganhar confiabilidade e, claro, desenvolver potência.
Em 1981, finalmente, uma Honda NR500 colheu o fruto de tanto empenho, curiosamente não em uma etapa do Mundial mas sim vencendo uma corrida de longa duração, os 500 km de Suzuka, no Japão. O motor finalmente alcançara a potência ideal, 130 cv girando a incríveis 19.500 rpm. Paradoxalmente a 1ª vitória da moto com pistões ovais, aconteceu, muitas quebras depois, numa corrida de resistência.
Na sequência desta conquista a Honda decidiu virar a página e se rendeu ao fato que, para vencer na categoria 500 do Mundial de Motovelocidade do início dos anos 80 era preciso usar armas iguais às da concorrência. Assim a NR500 foi substituída pela ágil NS 500 de três cilindros em V, moto que desde sua primeira temporada se revelou vencedora e conquistou o título mundial em 1983. Mas… essa é outra história!
Uma análise apressada indicaria que a opção ousada, os pistões ovais, se traduziu em fracasso. Todavia, a verdade é que o tremendo conhecimento técnico adquirido ao encarar o brutal desafio de fugir do lugar comum resultou em enorme conhecimento técnico, e na rara e exuberante NR750 de 1991, um concentrado de uma tecnologia vitoriosa mais por ter formado uma geração de engenheiros do que por efetivas glórias obtidas em pista.
Quase 30 anos depois das primeiras NR, a técnica adquirida por ter escolhido um caminho menos óbvio e mais desafiador é um precioso patrimônio presente nos mais variados modelos da atualidade, sejam eles voltados à competição ou ao uso no dia a dia.